domingo, 24 de julho de 2011

Artigo de Paulo Afonso Linhares

O OCASO DOS PARTIDOS

Paulo Afonso Linhares

A pedra angular do sistema democrático representativo e da própria organização estatal são os partidos políticos, tidos estes como instituições sociais de fins políticos, com caráter associativo, cujo escopo é de ser instrumento de coordenação e manifestação da vontade popular. Claro, nos regimes políticos baseados na autocracia (governo de poucos) os partidos perdem completamente sua razão de ser, se descaracterizam completamente e atendem a propósitos completamente alheios às idéias de democracia (governo de muitos). Verdadeiramente, os partidos políticos são vetores que canalizam e orientam as vontades de milhares de indivíduos na direção de objetivos políticos, traçados a partir de concepções ideológicas ou doutrinárias, tendo como principal a conquista do poder estatal.

No viés sociológico, Bluntschli defende que "[...] Os partidos não são instituições de direito público, nem membros do organismo do Estado, senão agremiações sociais de fins políticos.” Puxando para o campo tecnicista de sua “teoria pura do Direito”, Hans Kelsen assevera que os partidos políticos nada mais são do que “órgãos destinados à formação da vontade estatal”. O jurista Pinto Ferreira, todavia, reunindo as diversas teorias acerca dos partidos políticos, sintetiza magistralmente a sua concepção: "O partido político é uma associação de pessoas que, tendo a mesma concepção de vida sobre a forma ideal da sociedade e do Estado, se congrega para a conquista do poder político a fim de realizar um determinado programa”.

A tarefa que cabia, no passado, ao príncipe, hoje é do partido político; o moderno príncipe, segundo construção teórica do filósofo Antonio GRAMSCI, longe de ser uma pessoa real ou uma pessoa física, é, sim, um organismo social representativo da vontade coletiva. Destarte, a função que MAQUIAVEL atribuía a um indivíduo (o Príncipe), Gramsci atribui a um organismo social especialíssimo e fruto do crescimento político da sociedade (o partido político). Interpretando a concepção gramsciana de partido político, Nilson Borba Filho e Orides Mazzaroba (O partido político em Marx, Engels e Gramsci – disponível em: http://bit.ly/oLYWwb - 20/07/2011), dizem que “... GRAMSCI entende que o partido não é um organismo corporativo, mas, sim, um organismo universal, pois a possibilidade de tornar-se classe hegemônica condiciona-se na capacidade da classe operária elaborar, de modo homogêneo e sistemático, uma vontade coletiva nacional-popular, construindo um novo bloco histórico e assumindo o papel de classe dirigente. A construção dessa vontade coletiva é papel prioritário do partido político ou, segundo GRAMSCI, do moderno príncipe.

Bem, esse marco teórico já é suficiente para o que se tem a dizer, aqui, acerca da atual situação dos partidos políticos no Brasil. Sim, a despeito dos avanços das instituições democráticas, da consolidação dos direitos fundamentais e de uma concepção de cidadania, sob a égide da Constituição de 1988, fato é que os partidos políticos brasileiros (atualmente são 27 os registrados no Tribunal Superior Eleitoral) vivem uma debilitante calmaria e com baixíssima performance na conceituação que lhe dá parcela ponderável da sociedade brasileira. E todos em eterna crise, mesmo aqueles que, por vezes, desfrutam diretamente ou pegam alguma carona no acesso ao poder.

Crise por todos os lados e para todos os gostos: 1) o DEM de José Agripino se tornou gelatinoso e se desmancha a olhos vistos, sendo engolido aos pedaços pelo futuro PSD do prefeito Kassab; 2) o Partido da República, de Alfredo Nascimento, começa a enfrentar problemas enormes com as acusações de corrupção feitas a importantes membros de sua cúpula, através de cargos que ocupavam no Ministério dos Transportes; 3) o PT que até hoje não conseguiu refazer-se dos escândalos do “mensalão”; 4) o PSDB vive enorme crise de identidade entre SP versus MG (Serra ou Aécio Neves?) e, na condição de maior agremiação oposicionista, tem tido pouquíssimos êxitos; e, 5) o PMDB, que vive há muitos anos o dilema de sempre apoiar candidaturas majoritárias de outros partidos resumindo-se a ser ele mesmo um partido destinado a eleger bancadas parlamentares, ademais do fisiologismo que demonstra no desfrute dos cargos que abocanha nos governos aliados. Mesmo que saia uma reforma política – no que é difícil de acreditar neste momento – dificilmente os partidos políticos brasileiros atuais sairão da letargia que os consome. Na verdade, experimentam as diversas agremiações nacionais, o amargor do ocaso, mormente porque a maioria deles já morreu e ainda não sabe disso. As consequências serão drásticas, no médio e longo prazo, sobretudo porque podem comprometer o modelo democrático e a instabilidade das instituições republicanas. O ocaso das instituições partidárias será sempre o eclipse da democracia.

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